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"Ever tried. Ever failed. No matter. Try again. Fail again. Fail better."
por Fernando Lopes, 30 Ago 18
Nestes dias de modorra , só uma pausa até regressar à dolorosa rotina do pós-férias, dou comigo a parar no AXN White e a ficar especado a assistir a (mais) uma comédia romântica. Fiquei a reflectir no porquê: não te obriga a pensar, é uma espécie de fast food cinematográfico, em que, antes de trincar, já sabes qual vai ser o sabor. Nada de entusiasmante, nada que desiluda demasiado. Neste género as raparigas são sempre giras, os machos, mesmo com as suas idiossincrasias, bem parecidos, de coração bondoso e romântico. Os protagonistas do género são quase sempre tão bonitinhos e bondosos e é fácil identificar-mo-nos com eles, é assim que – quase – todos gostaríamos de de ser. Ao contrário da vida real, aqueles amores nunca correm mal, os pares românticos acabam sempre por serem resistentes às adversidades, e têm o que todos desejamos, são felizes para sempre. É a vida não como ela é, mas como idealizamos que deveria ser. É por isso que gosto de comédias românticas, naqueles minutos a vida é simples, fico apatetado, a achar que o mundo poderia ser perfeito sem ter de recorrer a substâncias ilícitas ou que fazem mal ao fígado.
por Fernando Lopes, 10 Fev 18
Não tenho nenhuma certeza, sequer opinião, sobre eutanásia, excepção à minha, que tenho a ideia de praticar se algum dia a dor se tornar insuportável. Mas pode acontecer de me acobardar, agarrar-me à vida, a uma esperança inexistente.
Há uns anos tive de pedir que abatessem o meu cão, Fred de seu nome, que me acompanhou durante treze anos. Não estive com ele nos momentos finais, fugi dali a chorar. Hoje foi a vez do Lucky, um dogue alemão de catorze anos, cão da minha sogra. Como ninguém tinha coragem para o acompanhar, voluntariei-me. Nem um grão de arrependimento. Ao contrário do Fred, que estava catatónico, o Lucky ainda estava orientado. Reconheceu-me, lambeu-me as mãos, tentou deitar-se de barriga para o ar para lhe bater na peitaça como costumava fazer.
Decidi não chorar ou ser dramático. Afaguei-o, disse-lhe que era um cão grande e tonto, chamei-lhe feioso, exactamente como ele gostava que o mimassem num dia de sol.
Não houve drama, morreu sendo acarinhado e ouvindo-me murmurar-lhe ao ouvido – Lindo menino, o Lucky é lindo. Se passasse pelas mesmas circunstâncias, fá-lo-ia de novo. Partiu para o céu dos cães e deve estar nas correrias com o Fred.
por Fernando Lopes, 1 Fev 18
Num jornal online, Nuno Artur Silva declara «ter os inimigos certos. Que mais posso desejar?». Não sendo como o galego, que não tinha inimigos porque os havia matado a todos, tenho os meus «inimigos de estimação». Gosto de os ter porque personificam tudo o que me causa asco: imodéstia, matreirice, falta de carácter, problemas de ego inflado, estúpidos que pensam ser mais espertos que todos os outros, calões que acham que se esforçam imenso, vendilhões de porra nenhuma. Gosto deles assim, todos os dias me relembram tudo o que tento não ser. Mais que Nuno Artur Silva, acho que ter inimigos é inerente a quem se esforça por ser íntegro e honesto. No fundo odeiam-nos porque sabem que somos melhores seres humanos do que alguma vez eles serão. Gosto muito de ter inimigos, e gosto muito dos meus inimigos.
por Fernando Lopes, 21 Jan 18
Muitos dos tipos da minha idade ambicionam poder ter um Porsche, como se a potência debaixo do pé compensasse a que começa a dar sinais de fraqueza «entre pernas». A verdade é que 54 são 54, as maratonas sexuais são coisa do passado, «cumprir» os deveres conjugais sem grande embaraço já não é mau, vamos olhando para o Viagra como uma solução de curto-médio prazo, e não algo que nos fazia sorrir como há dez anos. É a puta da vida.
Este vosso humilde escriba anda apaixonado por um MINI. Já aqui escrevi que na infância o pai Tinha um Mini Cooper, que nos inícios dos anos 70 nos levava ao Algarve em intermináveis viagens, malas em cima do tejadilho.
Agora, não sei por nostalgia, gostava de abandonar a barcaça de quase seis metros que conduzo por algo mais maneirinho, prático, e que me reavivasse essas boas recordações de um tempo em que tudo era possível. Será que sou estranho? Os meus sonhos materiais nunca foram os típicos – nunca ambicionei uma casa com piscina, um BMW na garagem e um camarote no Dragão. Agora, se e quando puder, vou comprar um MINI.
por Fernando Lopes, 8 Ago 17
Estava com um amigo a conversar sobre a vida, o amor, as mulheres – nós homens, falamos tanto de mulheres como as mulheres de homens. Trocavam-se ideias sobre frustrações e sucessos, amores e desamores.
- Oh pá, há já 25 anos que vejo sempre o mesmo pipi.
O companheiro soltou uma sonora gargalhada. Constatou que pelo meu ar descontraído e desbocado tinha a ideia que seria um conquistador ocasional. Nada mais falso, é-me intrínseco ser caninamente fiel. Fiquei a pensar quantas pessoas me julgariam assim. A minha natureza informal é inversamente proporcional ao jeito e vontade para relações ocasionais.
por Fernando Lopes, 7 Mar 17
Nunca li «Os Homens são de Marte, As Mulheres de Vénus» de John Gray, e os livros que procuram tipificar, compartimentar, comportamentos humanos, não são algo que me interesse. Logo aí fujo ao estereotipo e coloco-me como macho de características venusianas. Marte, deus da guerra, Vénus ou a sua versão grega Afrodite, a deusa do amor. O título do livro transformou-me numa espécie de aforismo, como se as diferenças entre géneros não fossem ténues e casuísticas. Associam-se aos homens o belicismo, agressividade, uma tendência para a racionalização em detrimento do sentimento, para as mulheres o mundo é mais de emoções e menos de razão, mais de amor menos de guerra. Numa qualquer resenha, tipifica-se que os homens são mais reservados, as mulheres confessionais. Devo ser hermafrodita. Não nego ocasionalmente existiam em mim comportamentos agressivos, mas de uma forma geral considero mais meus o modo de ver e sentir associados às mulheres. Também conheço mulheres que terão padrões e atitudes predominantemente considerados masculinos sem que com isso percam um pingo de feminilidade. Vénus e Marte, Marte e Vénus, temos a cosmologia completamente baralhada. Felizmente.
por Fernando Lopes, 2 Mar 17
Antes do advento do tunning, em que uns certos marmelos colocam luz negra debaixo do carro, aparelhagem de discoteca, bufadeiras que fazem tremendo cagaçal, jante 21” num carro que deveria ter 17”, cavalos extra para o motor partir mais depressa , etc. etc., o povo tinha uma personalização de viaturas bastante mais minimal. Lembrar-se-ão os mais velhos do rosário no retrovisor, o cão de peluche na parte de trás do veículo a abanar a cabeça, do separador da bagageira coberto de alcatifa de pêlo longo, da santinha, das bonecas sevilhana e havaiana. Eram tempos em que para se ser piroso não era preciso gastar uma fortuna, bastava colocar no coche umas almofadas de crochet feitas pela sra. lá da casa.
Como já sabem sou um tipo tremendamente preguiçoso, não ligo muito para roupa – basta ser preta – e detesto ir às compras. A minha mulher e filha iam a um centro comercial, numa das suas excursões em que se podem perder durante um dia inteiro.
- Terezinha, se não fosse maçada podias trazer-me uns boxers. Daqueles baratuchos, das lojas espanholas. Um pack de três, por favor.
- OK. Queres alguma cor especial? E que tamanho?
- Cor pode ser qualquer uma, tamanho XL.
Ora esqueci-me que emagreci doze quilos, e que XL podia ser excessivo. Um destes dias peguei nos meus boxers novos, acabadinhos de lavar e colocados na respectiva gaveta. Devem ser ligeiramente maiores que o habitual. Olhei ao espelho e parecia uma das bonecas havaianas que colocavam nos carros com excesso de pano por todo o lado. Dançava e a roupa íntima caía-me rabo abaixo. Desatei a rir da triste figura, um trengo é mesmo o que sou.
por Fernando Lopes, 1 Fev 17
Lá fora anunciam tempestade, pelas persianas o vento faz notar a sua intensidade uivando como só ele sabe. Escolhi um livro, e, na introdução, dou com a frase de Degas: «A arte é um vício. Não se desposa legitimamente, viola-se.». Penso como adaptaria o pensamento não à arte, mas à vida em geral. Viver, viver mesmo, é um vício. Sinto grandes angústias por minudências, choro com ridicularias, tenho fúrias com – e por causa – de gente que as não merece, vivo num permanente desconforto que é a essência da vida. Fiz tudo e nada fiz. Amei, revoltei-me, ensandeci, trabalhei, sonhei, bebi, tive medo, fugi, pensei. Mentiria se dissesse que faria tudo da mesma forma. Não. Fiz erros de que me arrependo, fui nobre algumas vezes, mesquinho outras tantas. Aprendi. Vivi. A minha vida é um armário cheio de coisas extraordinárias, pessoas extraordinárias, momentos extraordinários. Um armário infinito, onde espero continuar a armazenar tudo o que aprendi com ela. Com essa mesmo, a vida.
por Fernando Lopes, 20 Jan 17
Como a maioria das pessoas «do meu tempo», fui educado com padrões éticos que hoje são considerados antiquados, desajustados, sem valor. O que antigamente seria gabarolice hoje é auto-estima; a compaixão é vista como uma fraqueza; o carácter como algo adaptável aos que nos rodeiam e às suas circunstâncias; a lealdade algo que se vende por bem menos de trinta dinheiros; a forma mais importante que o conteúdo. Por estas e outras, este tempo do «pós-ética» já não é o meu. O problema, se é que existe, é que algumas pessoas mais velhas embarcam alegremente nesta onda pouco recomendável para se sentirem modernos. Não ambiciono viver neste momento em que tudo é negociável, em que a integridade é algo que, como um ramo de árvore, baloiça ao sabor do vento. Assim, como um velho tonto que se enganou na entrada da autoestrada, circulo em contra-mão. A vantagem é que por muito que achem que vou no sentido errado, sei que o caminho é o que a minha consciência – algo também em desuso – me diz para seguir.
por Fernando Lopes, 19 Jan 17
Muitas mulheres têm rituais sazonais com roupa. Mudam as coisas do armário de verão para o de inverno, colocam umas num local prioritário em relação às restantes. Nenhum homem perde tempo com isso. Gajo que é gajo está-se nas tintas, apenas veste uma camisola quando está frio, nem sequer sendo muito exigente com o que lhe calha em sorte, bastando que esteja lavada. A chefa cá de casa andou a organizar os trapinhos, aproveitou para me propor uma limpeza dos meus. Tinha coisas que não vestia desde os anos 90, mas porra, eram as minhas coisas. Ora eu tenho «roupa afectiva». Explico o conceito: preservo um blusão de pele há mais de trinta anos porque a minha avó mo deu e porque naquela altura custou cinquenta contos, uma pequena fortuna; existem Levi's já meias podres que me recordam momentos felizes e não quero delas abdicar; tenho uma t-shirt de cada país que visitei e não planeio deita-las fora; conservo algumas tralhas de juventude porque me recordam esses tempos de Frei João Sem Cuidados. Obviamente, tive de ouvir a piada: mas é tudo afectivo para ti? É. Sou um tipo de afectos, até com as roupas crio algum tipo de relação. São cenas de gajo, minhas, as meninas não têm que compreender, apenas aceitar. Só um gajo ganharia alguma forma de amor a um par de botas.
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