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E se o teu blogue mudasse a vida de alguém?

por Fernando Lopes, 30 Dez 16

urgência.jpgPalavras de parede, nos Mártires da Liberdade

 

Acho que ninguém decide escrever, fá-lo porque é a forma em que se sente mais confortável a comunicar. Este vosso escriba não tem mais objectivo que o de transmitir sentimentos, ideias, ao outro que está desse lado, como se de uma infantil conversa com um amigo imaginário se tratasse. As consequências das palavras, o modo como tocam quem as lê, já não é algo que consiga controlar. Há quase dois anos, conhecei um tipo artístico e tímido com quem tinha estabelecido empatia, através desta coisa dos blogues. Tornámo-nos amigos, tentei acompanhá-lo, aconselhá-lo, o melhor que podia e sabia, num momento difícil desta coisa transitória a que chamamos vida.

 

Também pela estranha magia da palavra escrita, conheceu uma rapariga por quem se apaixonou. E a rapariga por ele. E tudo começou aqui no blogue. Involuntariamente, apadrinhei uma relação amorosa que me enche o coração de ternura. Quando fala dela sorri com o seu jeito infantil, um menino que reencontrou o melhor que o mundo tem para dar: amor.

 

Estive com ela apenas uma horas. É gira, viva, inteligente, decidida. A delicadeza dele é complementada pelo sentido prático e arrojo dela. Fazem um par de amantes e compinchas plenos de cumplicidade.

 

Só por estes momentos de felicidade que esses dois seres humanos tão especiais estão a viver, já valeu a pena andar estes anos todos a mandar palavras ao vento. Disse. 

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Quase famoso.

por Fernando Lopes, 1 Out 16

Tenho no blogue um widget que conta as visitas. Cai-me a coisa no email todos os meses para ir para o lixo sem sequer ser aberto. Já aqui escrevi que a minha medida de sucesso são os comentários, mais que a quantidade, a qualidade dos mesmos. É frequente ter comentários melhores que a posta que os pariu, alguns profundamente críticos e pertinentes, outros ainda de partilha total e coração aberto. É disso que gosto. De qualquer modo o Sapo diz-me que no último ano tive 50.993 visitas, uma média diária de 130 visitantes, 95.436 páginas vistas, numa média diária de 242. Não sei se é bom, se é mau, como é que me coloca nos rankings. Estou-me a cagar. Melhor, não estou, porque significa que muitos visitantes entram mudos e saem calados. A todos agradeço, aos que por timidez se abstêm de participar fica o convite para, sem medos, entrarem na conversa, porque é disso que se trata, uma conversa.

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Clientela habitual.

por Fernando Lopes, 4 Ago 16

Há muitos, muitos anos, antes de o turismo de massas ter tomado conta da ilha do Porto Santo, passei lá umas férias. O sítio era como gosto, uma calmaria total, restaurantes familiares que nos iam buscar e levar ao hotel, um ou dois bares onde todos se conheciam, o Manel da Carreta ainda não era atracção turística. Alugámos dois carros utilitários (éramos seis) para uns dias de passeio pela ilha. No turismo indicaram-nos um bar num planalto de onde se tinha vista para o aeroporto e para a pista, que naquele local cruza a ilha quase de uma ponta à outra. Nessa época não havia GPS, pelo que, guiados por mapas e questionando os indígenas, demos com o objectivo.

 

Era um sítio maravilhoso, oásis no meio da aridez da ilha, com árvores, pequenos lagos, peixes, patos e outras aves passeando-se por entre os escassos clientes.

 

Perguntamos ao proprietário porque não fazia publicidade. A resposta foi clara:

 

- Não quero cá muita gente, fazem barulho, estragam as plantas, não respeitam os animais, causam mais transtorno que proveito. Prefiro os clientes habituais e um ou outro que vêm cá por recomendação de amigos, são pessoas de confiança, respeitam a casa e o ambiente.

 

Dei por mim a pensar como isto se aplica a este blogue. Conheço os meus fregueses, as suas manias e eles as minhas, tratam-me bem, tudo funciona. Não quero cá muita gente, corre-se o risco de estragar o bom ambiente, afastar a clientela habitual, tratar mal este animal que vos escreve. O dono do bar estava certo.

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Promessa.

por Fernando Lopes, 22 Jul 16

Expressar-se através de alguma forma de arte é sempre uma necessidade interior e individual. Não tendo a pretensão que escrever num blogue é uma forma de expressão artística – estou absolutamente seguro que o não é – a necessidade de comunicar é do indivíduo, sobretudo consigo mesmo, reflectindo ou revivendo episódios através da escrita. A maioria de nós dá uma importância absolutamente despropositada à merda que escreve. Tendemos a fazê-lo para o que supomos ser um público, como se o mundo ficasse mais pobre sem nós e o nosso canto. Também tive ilusão de valorizar as visitas, pageviews, e essas tretas. Depois cresci, percebi que é um instrumento que pode eventualmente interessar a um ou outro, mas é sobretudo uma forma de individualidade. Se muita gente gostar, óptimo, se não, tudo bem na mesma. Termos noção da nossa infinita pequenez, da importância que não temos, é uma forma de liberdade sem igual. Escreves não para agradar ou confrontar, apenas porque te apetece. Se como eu, fazes um diário, tens de ter a capacidade de te expor. É essa a tua forma de dar, assumindo fragilidades, manias, tristezas. Os leitores são muito mais espertos que tu, sabem à primeira se estás a ser autêntico ou não. Escrevo isto, porque pela primeira vez em muito tempo estive a olhar para as estatísticas do Purgatório. Parece que há muita gente que gosta, fico feliz. A única promessa que faço é manter a autenticidade, chorar quando tiver vontade, rir sempre que me apetecer, ser confessional quando assim tiver de ser.

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Candidatos a críticos literários.

por Fernando Lopes, 28 Jun 16

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Quando compro um livro gosto de dar uma volta pela bloga a ler opiniões alheias. Arrependo-me sempre. Admiro imenso quem escreve de modo sério, laborioso, trabalha um enredo, dedica tanto a aperfeiçoar o escrito como a escrever. Como sei que o talento é escasso mais essa admiração cresce, pois qualquer das «estórias» que leio me seriam impossíveis de urdir. Para se saber escrever é primeiro preciso saber ler. Há blogues de crítica literária em que os autores não sabem fazer uma coisa nem outra. E os comentários senhores, porque os escrevem assim?

 

A propósito de «O Sentido do Fim» de Julian Barnes, deparei-me com isto:

 

«queria dizer que o livro necessitaria de mais do que as 152 pág. que tem para ser grandioso. Pode-se fazer muito - e bem - em poucas páginas mas há limites e para aprofundar tudo aquilo que é aflorado e tornar este livro mais rico penso que lhe falta tamanho - corpo.»

 

Corpo, um cartapácio, isso é que era. Qual depurar a escrita, qual minimalismo, qual quê, nunca se escreveu nada de grandioso em menos de 300 páginas.

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Stuff no one told me.

por Fernando Lopes, 23 Mai 16

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 muito mais em stuff no one told me

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Pérolas.

por Fernando Lopes, 24 Jan 16

Ana de Amesterdam, Carla Romualdo, J. Rentes de Carvalho, Soliplass, são estrelas da blogosfera mesmo que o não saibam ou queiram assumir. De Rentes de Carvalho nem é preciso falar, a obra fala por si, é provavelmente o maior escritor português vivo. Ana de Amesterdam é muitas vezes brilhante, outras tão brutalmente sincera que dói. Carla Romualdo é de uma delicadeza na escrita, emotividade contida, capacidade de captar um momento, absolutamente única, de leitura indispensável. Uma princesa que escreve como tal. E depois temos Soliplass, que tenho o prazer de conhecer, e que apesar do breve encontro me inspirou profundo respeito e admiração.

 

O porquê está em postas como esta, «Um Presidente do Povo». A ler. Obrigatoriamente.

 

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A verdade, nada mais que a verdade.

por Fernando Lopes, 7 Jun 15

Fui impreciso na estória que contei sobre o meu homónimo cinematográfico. A memória traiu-me, o pitoresco do episódio fez-me acrescentar um facto não verdadeiro. Recebi hoje um email que reproduzo na íntegra, com as minhas desculpas à Maria. Como demonstrou sentido de humor, creio que também aceitará que a minha versão era bem mais divertida.

Corrijo: o cineasta morreu em maio de 2012; o pretenso e pretensioso "guião" foi enviado para o homonimo no ano anterior. O último filme de fl, que vi, teve estreia também posterior à data desse envio. Jornais, livros e filmes sempre estiveram presentes e jamais por sugestão de quem quer que fosse.
O desencontro continua a ser um potencial guião (agora para o Botelho, que também não morreu ainda), porém prefiro-o vero e sem co-autoria.
"Quem conta um conto acrescenta um ponto"???

 

Curvo-me humildemente perante a Maria.

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Desencontros.

por Fernando Lopes, 3 Jun 15

Ter um blogue gera sempre algumas confusões e desencontros. Porque te interpretam mal, porque julgam que és outrem, aprendemos a expensas próprias que as palavras, uma vez publicadas, deixam de ser nossas e passam a ter tantos significados quantos os leitores. Primeiro mete medo, depois habituámo-nos. Já me aconteceram alguns desentendimentos, mas não resisto a contar o mais divertido de todos. Há tempos fui abordado por email. Uma senhora manifestava o desejo em ser guionista de cinema e anexava uma história dramatizada, com indicação de planos, fade-outs e mais linguagem técnica da 7ª arte que desconhecia. Pensava ela que enviava um email a Fernando Lopes, o realizador de cinema, e não a este vosso servo. Respondi-lhe que tinha todo o gosto em ler o guião, mas talvez fosse melhor ir vendo os jornais e acompanhando o meio cinematográfico, uma vez que o Fernando Lopes, notável do cinema, tinha falecido há mais de um ano. Fernando, se aí de onde estás me lês, tens sugestão de nova história para filmar.

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Coisas boas.

por Fernando Lopes, 16 Jan 15

Soliplass já me deu boleia no seu cavalo-a-motor amarelo, estacionou-o cuidadosamente e esqueceu a chave na ignição, bebeu umas cervejas comigo, brinda-me amiúde a sua prosa, da melhor que anda pelos blogues. Além de talento, tem também generosidade para partilhar. Atentem nesta crónica de Daniel Abrunheiro:

 

À toujours comme tous les jours

 

Bruma e geada cingem a respiração em andamento. Uma pessoa vem por beira-rio, está frio, é tempo dele, as botas escrevem no chão o dois-por-quatro do caminho, sabe bem devolver em vapor ao ar o que dele veio em gelo. Com alguma sorte, é-se tão natural como cada signo do dia novo: os próprios braços como os das árvores, a água na boca como a do rio persistindo ambas em chegar um dia ao mar, a fervura do cartoon do pensamento como o desenho-animado do vento nas coisas volúveis, volantes coisas, venais é que não. A hora não é de relógio, a manhã não é de calendário: outra coisa serão, outro sentido terão, ser nelas é quanto basta. Para já.
Chega a pessoa ao balcão da Ermelinda, já ela lida trapos e vidros, da máquina-cafeteira silva o nevoeiro cálido, pelo chão a serradura fresca espera a cuspidela dos de mais brutos modos, desligada da ficha a arca dos gelados espera o Estio e a criançada colorida dele, sabe bem apear o bornal, sabe bem hastear os bons-dias aos congéneres de Língua e Pátria que vêm ao mesmo, a Ermelinda servindo a cada um o necessário sem perguntar o quê a quem, longos anos num gesto resumidos que é serviço e (re)conhecimento do Outro.
Lá fora, a música do mundo afina seus naipes: as ovelhas-chocalhos, os pardais-apogiaturas, o sacristão-badalão, a prata barroca do fontanário perpétuo, a trompa de ter nascido e mesmo assim o sol vir assim mesmo. Ninguém faz por pôr o seu deus, se algum, à frente dos outros na bicha do Paraíso, se algum, muito menos alguém se lembra de matar o próximo em nome do longínquo, a Ermelinda é que sempre diz que o negócio de cada um não é a venda de todos.
Casados no palato o figo e a aguardente, agora sim, agora é hora-número, o dia é já qualquer-coisa-feira, o trabalho não azeda, vai o mestre da escola para a escola, o da oficina para a oficina, o da muita terra para a leira, o do pouca-terra para a estação, o das cartas para o correio. Ranchos de mulheres algaraviam o perpétuo interesse da vida a caminho da fiação. Guincha o postigo meio-corpo do sapateiro. Trissa altíssimo o manicómio feliz da passarada no plátano grande do rossio. Fico a sós com a Ermelinda, que confia na honestidade da minha solidão para ir ali num instante ao peixe e aos jornais, olho a repetição de cada mesa à espera da novidade do fantasma, vou abrindo o bornal, tirando dele o lápis, a caderneta para que copio as coisas importantes, dessa “suprema importância que passa no dia seguinte” anotada por um tal Pessoa, pessoa que também gostava de aguardente, de figos não sei, de figos gostaria Caeiro, se algum.
Boa coisa: à volta da Ermelinda, quase sem quê e de todo sem para-quê, tenho a crónica feita. Ajunto caderneta e lápis de retorno às entranhas de pano do saquitel, engulo uma para o caminho (bebe muito a pretexto de si mesmo, o sacana do caminho) e é já quando devasso no pórtico as fitas verticais contra o mosquedo que, ao meu Até-logo-Ermelinda, dela ouço esta bonita coisa:
– Até sempre, Charlie.

 

Obrigado a ambos.

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