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Pudesse Eu Contar as Vezes

por Fernando Lopes, 1 Abr 15

Pudesse eu contar as vezes que ferrei os cantos da boca imaginando que eram teus os dentes que assim me amavam; que eram os teus lábios aqueles que, nessas ocasiões, eu mordia. Lembras-te de uma frase que costumavas citar, por tê-la escutado em qualquer parte, ou lido, já não sei bem? Aquela que dizia
- A minha anatomia enlouqueceu; sou toda coração.
Pois é como me tenho sentido, mais ou menos assim, com a anatomia enlouquecida, sem saber já quais são os meus dentes ou qual a minha boca; como se cada pedaço meu não fosse mais do que saudade de ti: o desejo de te voltar a ver, de te cobrir outra vez de beijos - olhos, boca, rosto, o corpo todo de beijos -, de te abraçar e sentir o teu cheiro, de tomar nas mãos o ramo crespo dos teus cabelos e inalar a fragrância do teu pescoço. Possuo agora, em mim apenas, nos limites da minha topografia, toda a exaltação dos nossos corpos e sinto que não chego para tanto porque a soma de nós dois excedeu sempre a existência física dos nossos corpos. É como se rebentasse por dentro e tivesse de esticar a alma - ou lá o que é - para me ser possível reter ao menos um pouco do que daí sobrou.

 

MANUEL JORGE MARMELO, «O AMOR É PARA OS PARVOS»

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4 comentários

De Calimero a 01.04.2015 às 11:44

Poema perfeito, para um dia imperfeito de memorias que teimam em vir a tona em dias solarengos como os de hoje..!

Obrigada pela partilha ..Gostei muito!

De Fernando Lopes a 01.04.2015 às 19:00

Manuel Jorge Marmelo é um tipo talentoso. A coerência e o facto de ser de esquerda já lhe trouxeram alguns espinhos, mas também a admiração e respeito de muitos.

De golimix a 04.04.2015 às 22:26

Lindo! Aqueceu-me o momento. 

De Fernando Lopes a 04.04.2015 às 23:21

Faz uma certa inveja depara com um texto destes. Uns nascem para isto, outros nem por isso. 

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