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Por tua causa ando a alugar o bacalhau.

por Fernando Lopes, 30 Set 16

Hora de almoço. Enquanto me dirijo para o trabalho, uma profissional do amor caminha atrás de mim e discute acaloradamente com o seu empresário ao telemóvel. O linguajar da senhora é intenso, e reparem, estou habituado a intensidade desde que de tenra idade acompanhava a avó ao Bolhão. Entre múltiplos, caralhos, foda-se, sai-lhe um putinha que te pariu. Achei ternurento, putinha que te pariu é quase como dizer «a tua mãe não é lá muito séria, mas paciência». Depois remata com um «por tua causa é que ando a alugar o bacalhau». Simplesmente poético. De facto, a transacção comercial vulgarmente conhecida como prostituição, não passa de um aluguer. Não vende, porque isso significava propriedade permanente, hipoteca, o diabo a quatro. Não dá, porque tal seria de borla, arruinaria o negócio, teria de pedir um Plano Especial de Revitalização (PER). Suponho que só dê, mesmo dado, ao manager com quem trocava ideias e a um ou outro amigo de ocasião. De facto, trata-se de um aluguer. Quando um tipo pensa que já ouviu quase tudo, há sempre uma meretriz que nos faz notar que a língua – a falada, está bom de ver – pode ser enriquecida com coloridas definições.

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17 comentários

De Inês a 30.09.2016 às 12:42

A isto eu chamo "poesia à moda do Porto". Muito bom.
Bom fim-de-semana.
Inês

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 12:53

Portugal é um país de poetas, até as mulheres da vida conseguem descrever a profissão de um modo criativo. ;)

De alexandra g. a 30.09.2016 às 22:24

Sei, by now, que não és preconceituoso, ou jamais aqui regressaria, mas


"até as mulheres da vida conseguem descrever a profissão de um modo criativo"


convenhamos... contém preconceito, ligeirinho, ligeirinho ("até..."), mesmo sabendo que também comporta elogio (a criatividade: e quem não a tem? de resto, a cama é dos lugares onde deveria falar mais alto :P)

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 22:40

«Até» por se revestir de alguma improbabilidade, só isso. Se ouvisses o palavreado, por certo não esperarias que terminasse de forma tão poética. 

De alexandra g. a 30.09.2016 às 22:42

Mas improbabilidade, porquê, Fernando?

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 22:47

De uma pessoa calejada pela vida daquele modo, com uma rudeza- justificada, bem sei - muito grande, que insulta um chulo, eu e apenas eu, fiquei surpreso. Serei um burguês de merda? Talvez sim, talvez não. 

De alexandra g. a 30.09.2016 às 22:52

Não és, seguramente, um burguês de merda, és um gajo decente (estou, propositadamente, a esquecer-me do episódio com a Pilar :P) mas, desta vez (não me recordo de outra e, repara, não te leio há tanto tempo assim), foste absolutamente burguês. O facto de apreciares o cotê poétique não retira, àquilo que escreveste, o lado burguês. No worries, however, somos classe média, cada um de nós revela o seu, a seu modo :)

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 23:22

Sou simplesmente o produto do meio onde fui criado, como dizia António Aleixo. 

De alexandra g. a 30.09.2016 às 23:27

deixa-te de merdas, és muito mais e isso eu sei, já o li aqui :D

De Anónimo a 30.09.2016 às 13:13

Uma amiga de quem te falei e que andou na "vida" disse-me "eu não dava o pito, era leasing".
Filipe habitualmente

De Lucília a 30.09.2016 às 13:31

Nascer mulher é uma fatalidade,
e quando tomamos consciência dela já carregámos com o mundo algumas vezes.
Mas que somos magníficas a contornar o peso do mesmo -isso somos!!

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 18:31

Concordo, Lucília. Caso contrário, muitas vezes seria insuportável ser mulher. 

De alexandra g. a 01.10.2016 às 22:56

Ora foda-se, Fernando, eu, que ando no desemprego dos dias vai para 9 anos, merecia um comentário igual ao da Lucília A.


Agora vou ali amuar um pedaço :P

De Fernando Lopes a 01.10.2016 às 23:07

Alexandra, imagino que estar desempregado seja dificílimo. Se fosse um mentecapto seria mais tolerável, um pessoas interessada, inteligente, deve sofrer ainda mais. Não tenho muito para te dizer, apenas posso mandar um abraço sentido. Não resolverá grande coisa, mas talvez traga um pequeno conforto. 

De alexandra g. a 01.10.2016 às 23:20

"desemprego dos dias" é a expressão que uso há anos para justificar um emprego de merda, de muito baixa remuneração, não trabalhando naquilo que gosto, trabalho para o qual possuo carteira profissional, por mor do divórcio: pagam, invariavelmente, 2/4//7/8 meses depois... imposssível manter "uma vida", nestes moldes.


Concordarás, decerto, com a fórmula que encontrei para esta porra que é ter "emprego"...

De Fernando Lopes a 01.10.2016 às 23:27

Nesse aspecto sou um nheca. Acomodei-me, habituei-me a ser relativamente bem remunerado, nunca fiz o que gostava. Agora só espero pela reforma dos dias para poder fazer o que bem me apetecer. 

De Fernando Lopes a 30.09.2016 às 18:30

Achei piada à expressão, não está aqui implícito nenhum julgamento à mais velha profissão do mundo. Antigamente haviam uns pândegos que vendiam time-sharing,  uma casa paga e usufruto de vários. Vamos chamar-lhe «amor em time-sharing». 

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