Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Razões de sangue.

por Fernando Lopes, 26 Abr 15

Sempre me senti um enjeitado; explica-se o facto por não ter sido criado pelos meus pais, antes deixado ao cuidado dos avós. Fui excelentemente tratado, uma infância preenchida pela melhor mulher do mundo, que me amou e cuidou como nenhuma até hoje. Debaixo de um modo rude, agressivo, por vezes temerário, outras auto-destrutivo, ficou o trauma de ser um filho «abandonado». Nunca o perdoei. Como nunca perdoei o facto de o pai me ter destruído o sonho de toda uma juventude ao prometer-me um moto e rapidamente se ter esquecido disso. Ambos eram absolutamente centrados em si mesmo, sempre foram assim. Serem pais foi algo que fazia parte da época, não um apelo profundamente sentido. O pai, por dever de ofício, era obrigado a deslocar-se com frequência a Londres. Recordo bem o ataque de ciumeira da mãe quando foi preterida numa viagem a Inglaterra, em que com 17 anos fui convocado para acompanhar a figura paternal. As palavras que mais me chocaram, mais dor e desilusão me causaram, foram-me ditas pela mãe. Por isto e mais, nunca fomos propriamente íntimos. Nem somos. E no entanto, agora que a vejo hospitalizada, preocupo-me profundamente. Está a reagir bem, certamente sairá airosamente desta. Racionalmente devia ser-me indiferente. Não o é. Um ataque de preocupação filial não estava nas minhas previsões. Talvez em momentos de crise o sangue fale mais alto que a razão. Não sei se é bom ou mau, é simplesmente assim.

Autoria e outros dados (tags, etc)

Pesquisar

Pesquisar no Blog

Feedback

subscrever feeds