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As minhas amigas para mim são homens.

por Fernando Lopes, 31 Out 12

É mentira, hipocrisia masculina no seu estado mais puro. Tenho a sorte de ter várias amigas, muitas delas inteligentes e bonitas. Admiro-as pela sua sensibilidade, sentido crítico, espírito prático. Distingo claramente os planos, e nunca, mas mesmo nunca, fiz charme para cima de uma amiga por uma razão simples: prezo acima de tudo a relação que mantemos. Mas não sou insensível aos atributos femininos, mesmo no meio de uma discussão sobre Wittgenstein (um tarado que se passeava à noite pelos bosques de Viena para ser sodomizado violentamente por marginais). Nenhum homem heterossexual é insensível ao encanto do sexo oposto. Um decote revelador, uma saia curta que descobre uma perna longa não são motivo para não colocar uma relação fraterna em primeiro lugar. Eu e milhares de outros, resistimos, preservamos esses valores. Mas, com excepção de um eunuco, a condição masculina não se desliga perante a ignição da amizade.  

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Continua a saga das avarias de tudo o que é movido a energia eléctrica nesta casa. Agora a máquina de secar começou a fumegar. Deve ser por estarmos na época das castanhas.

 

Recordo-me de um episódio passado com um amigo de infância. Quando entrou na faculdade, o pai ofereceu-lhe um carro usado. Como se safava brilhantemente nos estudos, anos depois, teve de presente um carro novinho em folha, um AX Platinum. Azar dos azares, foi abalroado por um Rover 3500, uma coisa gigantesca, que lhe destruiu o carrinho. Penou, embirrou com o seguro e finalmente teve direito a uma viatura nova. Ao sair do stand, põe o nariz do novo pópó de fora e catrapás, um outro acidente, mesmo sem sair totalmente do concessionário. Resolveu o problema de forma definitiva colocando um santinho no porta luvas. Funcionou até hoje.

 

Eu cá não sou de crenças, mas pelo sim, pelo não, importam-se de me dizer o nome da santinha dos electrodomésticos? É para pôr uma na cozinha.

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Dupont e Dupond.

por Fernando Lopes, 29 Out 12

Discordo dos comentadores políticos que asseguram que o governo actua às cegas, sem orientação ou objectivo. Pelo contrário, Pedro e Gaspar, como os célebres Dupont e Dupond, são duas faces da mesma moeda; o ultraliberalismo de Friedman extrapolado para o Portugal do séc.XXI. Pedro é o boneco giro, bem falante, com uma dicção inatacável; Gaspar o cérebro de toda esta política que visa desmantelar a rede de igualdade e solidariedade que conhecemos como estado social.

 

Não estão equivocados, estão a levar a cabo o seu programa, que se resume a um estado mínimo, à quebra da solidariedade intergeracional, à disseminação da filosofia do "salve-se quem puder". Desenganem-se os que dão o governo por desconhecedor do impacto do OE 2013.

 

É uma política de terra queimada, a ideia de criar uma "zombie zone", onde os mortos-vivos matam para assegurar a sua sobrevivência catatónica. Eles sabem bem o que fazem, perseguem os seus objectivos. A "refundação" mais não é do que uma revisão da constituição para acabar de vez com o que resta do estado social. A crise é terreno fértil para o desenvolvimento destas "teorias". Sobre o seu manto diáfano, escondem-se incompetências e dependências dos nossos gestores, bons a governar no tempo de "vacas gordas", um desastre quando os ventos são adversos.

 

A guarda avançada deste objectivo começa a clamar contra a Constituição da República, uma "força de bloqueio". Entramos em terreno pantanoso, onde a ambiguidade da "abstenção violenta" é tão perigosa como os ímpetos reformistas de ultra-liberais. Esperemos que a não existência António José Seguro, por uma vez, cumpra os mínimos de decência nesta maratona que nos quer destruir enquanto nação solidária.

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Cemitério de elefantes.

por Fernando Lopes, 29 Out 12

O mito do cemitério de elefantes não é totalmente falso. Os animais mais velhos não conseguem acompanhar o ritmo da manada e vão ficando para trás. Por outro lado, a vegetação que faz parte da sua dieta habitual é demasiado dura, causando dificuldades extra aos animais seniores, com as presas e dentição muito desgastadas. Assim, debilitados, buscam locais com vegetação baixa e tenra, onde o tempo corre inexorável. Morrem muitos, muito velhos, em áreas relativamente restritas.

 

Vieram-me estes factos à memória porque Portugal arrisca-se em muito pouco tempo a transformar-se num gigantesco cemitério de elefantes. Ontem, num jantar de amigos, muito consideravam a hipótese de emigrar. Uns para o norte da Europa, outros para o Brasil. Não estou a falar de jovens recém-licenciados, o que seria certamente grave, mas de profissionais prestigiados, alguns a ocupar lugares de chefia. A falta de perspectivas, os baixos salários, a perseguição política, levam gente de reconhecido mérito e talento a colocar seriamente a hipótese de abandonar a sua terra natal.

 

Ficaremos por cá meia dúzia. Uns porque romanticamente preferem combater antes de desistir, outros, como eu, demasiado velhos para iniciar uma nova vida.

 

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A sobrevivente.

por Fernando Lopes, 28 Out 12

Todos conheçemos pessoas que são, para nós, um exemplo. Hoje partilho a minha admiração por uma criança que celebrou recentemente três anos. É filha de dois grandes amigos meus e um exemplo de coragem e tenacidade para todos. Nasceu prematura e teve uns primeiros tempos num limbo entre a vida e a morte. Há não muito tempo sobreviveu a um pneumonia extremamente grave. Franzina, é um poço de alegria. Não nega beijos e abraços, diverte-se a pregar partidas, gosta de cantar e de música, e por isso oferecemos-lhe uma enorme guitarra eléctrica. É prova de que o amor é o melhor medicamento que existe. Um dia deste, quando fores mais crescida, vamos ouvir-te a rockar com a alegria de sempre, as angústias no lixo, o pequeno coração cheio. Parabéns A.

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Farsolas.

por Fernando Lopes, 26 Out 12

Muito poucos homens chegados à proximidade dos 50 admitem que a sua libido já não é a mesma de um rapaz de 20. Que temos relações sexuais menos vezes, que já não conseguimos passar uma noite inteira "naquilo", que as nossas erecções já não conseguem suportar um par de botas da tropa como acontecia em tempos idos. A tendência para a gabarolice é prática inata entre o sexo masculino. Ouço-os e rio-me. Se já não conseguimos correr 100 metros em tempo recorde, como haveríamos de manter a "performance" sexual de um atleta olímpico?

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O reino de Paga-E-Não-Bufes

por Fernando Lopes, 25 Out 12

Na ponta mais ocidental da Europa, rodeado de água por todos os lados menos um, está o reino de Paga-E-Não-Bufes. Os habitantes deste estranho reino, sempre que chamados a pronunciar-se sobre o governador que irá orientar a coisa pública, sofrem uma crise aguda bipolaridade. São espoliados sistematicamente ou pelo “animal feroz” ou pelo “lobo em pele de cordeiro”. Na essência, existem poucas diferenças entre estas duas espécies parasitárias. Ambas se alimentam de incompetência, compadrio e impostos, em doses a adaptar segundo as necessidades do momento.

 

Em tempos não muito distantes, os Paga-E-Não-Bufenses aderiram à comunidade dos Somos-Ricos-E-Não-Abdicamos. Entusiasmados com o dinheiro que chovia a rodos, oferta dos Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses, iludiram-se. Faziam tudo o que o outro reino lhe pedia. Não produzais têxteis, sapatos ou outros bens industriais; eles serão mais baratos se os adquirirmos aos Olhos-Em-Bico-Que-Trabalham-Por-Uma-Côdea; para quê incomodarem-se em tão aborrecido labor? Não vos preocupeis com os vossos campos e pescas; nós vender-vos-emos leite mais barato, bonitos vegetais que sabem todos ao mesmo, o vosso peixe será por nós pescado. Não vos canseis, dar-vos-emos um futuro de mel e ambrósia.

 

Os Paga-E-Não-Bufenses, ingenuamente caíram neste conto do vigário até ao dia em que lhes começou a ser cobrada a sua inércia. Pois vós que não fazeis a ponta de um corno, que quereis? Que continuemos a patrocinar o vosso ócio? Em vão reclamaram das belas carruagens bárbaras a que se tinham habituado e que lhes tinham sido vendidas pelos Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses. Procuraram devolver caríssimas máquinas de andar debaixo de água, absolutamente inúteis que lhes tinham sido impingidas apenas para fortalecer a indústria dos seus vizinhos. Tinham desbaratado milhões em serpentes de betão, criadas sob o pretexto de exportar algo que não produziam. As ofídias estavam agora sem vivalma, uma vez que os Paga-E-Não-Bufenses não tinham dinheiro para circular nas belas carruagens adquiridas a crédito sobre a promessa solene de que a creditícia fonte não iria nunca secar.

 

Emprestar-vos-emos dinheiro para pagarem o que nos devem; não se esqueçam dos nossos “multiplicadores orçamentais”: por cada ouro que vos emprestamos queremos um ouro e meio. Em estado de necessidade, aceitam, mesmo sabendo da impossibilidade de pagar tal dívida. Elegeram o “lobo em pele de cordeiro” em substituição do “animal feroz”. Substituíram um néscio por um inapto. Os Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses não renunciavam aos seus juros e permaneciam insensíveis às dificuldades dos Paga-E-Não-Bufenses, para saldar uma dívida que tinha sido feita para os fortalecer, deixando-os na sua completa dependência. O governador “lobo em pele de cordeiro”, ignorava o sofrimento do seu povo e estava mais preocupado em ficar bem visto junto dos Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses. No fundo sonhava com o dia em que se juntaria ao cherne, um ex-Paga-E-Não-Bufense que vivia agora no fabuloso reino vizinho. O povo que sofra, dizia o governador, não passam de uns piegas, anos e anos a viver à custa dos Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses.



Esta história não está ainda terminada. Os Paga-E-Não-Bufenses podem decidir entre:

a) correr com os vendilhões do templo, renegociar com os Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses as condições, pagar a sua dívida de molde a que não morram de fome, iniciando um novo modo de vida;

b) tornarem-se escravos da dívida e consequentemente dos Somos-Ricos-E-Não-Abdiquenses.

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LIBIFEME.

por Fernando Lopes, 24 Out 12

À volta de uma mesa, numa conversa informal, três amigas de gerações diferentes (30, 40 e 50) falam da sua sexualidade e de um produto (LIBIFEME) que aumenta a líbido. Encaramos este anúncio com normalidade, esquecendo-nos que há apenas 10 anos atrás não seria possível ouvir senhoras respeitáveis a pronunciar a frase "sinto-me mais lubrificada". Nestes pequenos factos, aprecio a alteração de comportamentos relativos à sexualidade. É sinónimo de uma pequena revolução nos costumes a publicidade televisiva a um produto deste tipo. As mulheres de hoje são parte activa nas relações do casal, procuram ter e dar prazer. O facto de entre elas se encontrar uma mulher em idade não reprodutiva é também sintoma de que o sexo já não é encarado como obrigação ou mecanismo de procriação, mas prazer partilhado. Publicidade tão sem graça, encarna uma subtil mudança de paradigma. Tão imperceptível como significante.

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Todos os oceanos têm paredes?

por Fernando Lopes, 23 Out 12

 

A minha admiração por animais é proporcional à aversão a zoológicos, aquários e outros mecanismos de retenção que os humanos criaram para admirar o mundo natural sem nele se integrar. Não me surpreende pois que uma beluga, aprisionada, tenha contrariado a sua natureza, deixando de emitir sons através do tracto nasal e passado a usar a laringe. Também não é motivo de espanto que a palavra pronunciada seja "out".  A beluga sabe que os oceanos não têm paredes, anseia por liberdade. A questão é simples: a coberto do interesse científico quem terá coragem de deixar aprisionado um animal que grita por liberdade?

 

PS. - Já agora vejam esta estória.

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Searching for Sugar Man

por Fernando Lopes, 22 Out 12

 

Rodriguez era, nos anos 60, um músico talentoso que actuava no circuito de bares de Detroit. Editou dois discos sem fama ou proveito. Com concertos intermitentes até ao início dos anos 80, desapareceu do mundo da música. Rodriguez não sabia que era um êxito na África do Sul. Tinha uma popularidade enorme, sendo a sua música considerada a banda sonora de toda uma geração. Retirado, correu no país africano o boato da sua morte. Alheio a tudo isto, durante décadas, trabalhou na construção civil e estudou filosofia.

 

Uma das suas filhas descobriu que o pai era uma celebridade através de um site que lhe era dedicado. Os fãs sul-africanos de Rodriguez tinham iniciado uma busca pelo seu ídolo e uma série de coincidências felizes levam-no a actuar no continente negro, de onde apesar dos milhares de discos vendidos, nunca tinha obtido um cêntimo ou notícia da sua popularidade. Já sexagenário, recebe finalmente o carinho do público que lhe tinha sido negado durante décadas.

 

Esta história de fadas dos tempos modernos é contada pelo realizador sueco Malik Bendjelloul no filme "Searching for Sugar Man". Comovi-me com esta história, com a persistência de Bendjelloul e a simplicidade de Rodriguez. Como bom chorão não consegui conter uma lágrima.

 

A história do renascimento de Rodriguez pode também ser vista neste documentário da CBS.

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