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Da lisonja.

por Fernando Lopes, 16 Nov 18

Caros amigos com ambições a um lugar mais brilhante na vossa empresa: a graxa está out, a lisonja está in. Dir-me-ão que as duas são mais ao menos a mesma coisa. Embora substantivamente sejam iguais, a lisonja é mais eficaz porque joga com as inseguranças do artista a que ambicionamos dar lustro. Elogiemos pois o raciocínio arguto do nosso chefe, o seu brilhantismo face aos seus pares, as notas escolares da sua prole, a elegância magnífica da sua consorte. Tudo vale. Detectar a graxa é relativamente simples, muitas vezes óbvio. Já a lisonja pode ser direccionada ao elevado estatuto ético ou resiliência à adversidade do visado. É mais subtil, mais abrangente. Tenho notado gente consideravelmente inteligente a cair na esparrela. Para não ser sensível à lisonja o objecto da mesma terá de ser dotado de um «dinossáurico» espírito de auto-crítica. Afinal, o teu chefe tem medo que não gostem dele, de ter feito merda, de não ser merecedor do lugar que ocupa. Utilizar esta insegurança inerente a todo o ser humano, afagar não só o ego, mas toda a envolvente da vida de alguém que te chefia, é como o código postal, meio caminho andado para uma promoçãozita. Devem existir chefias altamente auto-críticas, só que ainda não conheci nenhuma. Pela inerência do lugar enfatuam-se, as mais das vezes sem razão para tal. Agora ide e praticai esta nobre arte, pois se não o fizerdes alguém o fará por vós. O tempo em que ética e carácter eram determinantes num percurso profissional, ficou bem lá atrás, aprisionado nos idos de 90.

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Cansado dos «fogareiros».

por Fernando Lopes, 20 Set 18

Os mais novos não saberão que «fogareiro» era gíria para taxista. Na minha experiência contam-se pelos dedos de uma mão os taxistas educados, com o carro limpo e cortesia bastante para merecerem o qualificação de profissionais. Há-os, mas são tão raros como gambozinos. Como automobilista é melhor nem me pronunciar sobre a delicadeza, urbanidade e respeito pelas regras de trânsito destes senhores. Uma parte substancial pensa que as ruas e avenidas são suas, os outros cidadãos motorizados meros obstáculos postos ali para seu infortúnio. Colocando fora da equação a justeza das reivindicações, que vista no tempo, me parece tão pertinente como a dos escriturários a favor da tinta permanente e contra a máquina de escrever, pergunto-me o que lhes dá o direito de ocupar as ruas que são de todos. Mais ainda, fazê-lo no reino da impunidade como se tivessem usucapião das nossas principais avenidas. Não sou contra que os senhores se manifestem, lutem pelo que acham ser os seus direitos, peçam audiências a ceca e meca. Já ocuparem ruas de modo semi-permanente é um abuso de uma classe para com os seus concidadãos, com o beneplácito das autoridades. Cá por mim apetece-me mandá-los enfiar os táxis e os taxímetros onde o sol não brilha.

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Envelhecer não é pecado.

por Fernando Lopes, 11 Set 18

A sociedade inteira anda obcecada em ser jovem, ou pelo menos aparentá-lo. É humano que cada um tente ter o melhor aspecto possível, alimenta o ego, a auto-confiança, mais do que isso, é muitas vezes um elemento facilitador para estabelecer relações pessoais e profissionais. Contra mim falo, há mais de dois anos que restrinjo as calorias que ingiro para não ter um ar pesadão. Vejo tipos bem passados dos cinquenta a pintarem os cabelinhos de preto, outros ainda a escolher fatos slim fit onde parecem prestes a explodir, alguns que tomam banho em perfume para animar o nariz e tapar a vista das senhoras. Meus amigos, vamos ter em conta um pequeno pormenor: Facto - não somos os tipos que éramos, a maioria de nós envelheceu muito, engordou, perdeu cabelo ou este mudou de cor. Facto – não é por andarmos com fato dois números abaixo do nosso, pintarmos o cabelo ou banhar-mo-nos em leite de burra que a coisa vai melhorar. Facto – a vitalidade vai esmorecendo, o tempo que tínhamos sexo três ou quatro vezes no mesmo dia já lá vai, é melhor assumir que as actividades fodengas são mais escassas porque o corpo, que não a vontade, já não são o que eram. Vamos deixar de tentar parecer gajos de trinta quando temos cinquenta. Chegados a esta provecta idade, vamos defendê-la com uma em que ainda valemos muito, senão pela estética, pela alegria, boa disposição, capacidade de fazer rir de nós e dos outros. Pode ser?

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Analisando os elogios despropositados da minha amiga Alexandra num comentário ao post anterior, faço uma reflexão de quão diferentes são os tempos no que diz respeito ao que vulgarmente é conhecido como humildade. Quando era criança, quem tivesse melhores notas que os colegas não dizia nada, para não os embaraçar e para não ser considerado marrão. Hoje, desde o 1º ano que os miúdos são incentivados a gabar-se se o seu resultado supera os dos demais. É para os estimular, tornar mais competitivos, dizem. Quando era jovem, um tipo que se achasse mais inteligente, mais bonito, mais habilidoso que os outros era imediatamente votado ao ostracismo por quem realmente importava. Basta recuar uma década, e, na geração que me precede, gente com 45 ou menos, gabarolice é igual a auto-estima. Na vida pessoal ou no trabalho, muitos desses rapazes e raparigas têm um ego infinito, vangloriam-se de grandes e pequenas coisas. Tal não me é permitido pela minha esmerada e antiquada educação. Ainda preso à ética dos anos 70, mesmo que consiga algo façanhudo, - o que não me recordo tenha acontecido - procuro não fazer ondas. A malta mais nova tem a capacidade de fazer de um cagalhão um poema. Quem quer acreditar neles, vá em frente, para mim uma poia será sempre uma poia, mesmo quando lhe chamam trufa.

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Porque gosto de comédias românticas.

por Fernando Lopes, 30 Ago 18

Nestes dias de modorra , só uma pausa até regressar à dolorosa rotina do pós-férias, dou comigo a parar no AXN White e a ficar especado a assistir a (mais) uma comédia romântica. Fiquei a reflectir no porquê: não te obriga a pensar, é uma espécie de fast food cinematográfico, em que, antes de trincar, já sabes qual vai ser o sabor. Nada de entusiasmante, nada que desiluda demasiado. Neste género as raparigas são sempre giras, os machos, mesmo com as suas idiossincrasias, bem parecidos, de coração bondoso e romântico. Os protagonistas do género são quase sempre tão bonitinhos e bondosos e é fácil identificar-mo-nos com eles, é assim que – quase – todos gostaríamos de de ser. Ao contrário da vida real, aqueles amores nunca correm mal, os pares românticos acabam sempre por serem resistentes às adversidades, e têm o que todos desejamos, são felizes para sempre. É a vida não como ela é, mas como idealizamos que deveria ser. É por isso que gosto de comédias românticas, naqueles minutos a vida é simples, fico apatetado, a achar que o mundo poderia ser perfeito sem ter de recorrer a substâncias ilícitas ou que fazem mal ao fígado.

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Em Abu Dhabi, sê Abu Dhabi.

por Fernando Lopes, 17 Ago 18

mesquita.jpg

Mesquita Sheikh Zayed, Abu Dhabi

 

Chegado aos Emirados Árabes Unidos, e após um dia de descanso, fomos a Abu Dhabi. Contrariamente ao mega-moderno e cosmopolitano Dubai, Abu Dhabi fez-me lembrar aqueles ricos de enésima geração, discretos, tranquilos, que gozam o luxo com discrição, sem exibicionismos e kitsch. Para qualquer leigo, o melhor hotel dos Emirados, a coqueluche do luxo, é o Burj Al Arab. Nada disso. É um hotel com um design peculiar, para se assemelhar com a vela de um dhow, uma embarcação local. A sua construção custou apenas 650 milhões de dólares, uma ninharia quando comparado com o Emirates Palace e o custo de mais de 3.000 milhões de dólares. É de uma arquitectura tradicional ainda e – se isso é possível – mais luxuoso que o seu irmão do Dubai. A plebe como eu, normalmente vê-o de fora, mas como se tratava de uma simples família proletária, o guia conseguiu entrássemos. Não sei como são os quartos, mas um lobby com mais de 2.000 m2, mármore de Carrara por todo o lado, relógios de parede da marca Rolex, revestidos a ouro. Muito luxo para um parolo como eu.

 

Para visitar a mesquita Sheikh Zayed, as meninas tiveram de se vestir conforme a tradição local. Abro aqui um parêntesis para referir que não senti que as mulheres dos emirados entendessem o uso da abaya como restritivo. Uma vez que quem a usa são as mulheres emirati, é, além de uma indumentária de acordo com a tradição islâmica, um sinal de classe, de casta. Mulheres muçulmanas pobres não usam abaya, ficam-se por roupas discretas e um lenço a cobrir a cabeça. A abaya diz: sou emirati, sou dos 20% da classe alta, dos que têm cidadania dos emirados.

 

O respeito pelos costumes, pela individualidade, é muito bonito, mas causou-me grande transtorno ver os pais a brincar na piscina com as crianças, e as mulheres todas encafuadas de preto a assistir à diversão dos outros. Num hotel repleto de estrangeiros, não entendi porque razão os árabes não deixavam a «arabice» à porta e diziam à patroa: - Ó filha, veste um biquíni e anda dar um mergulho que aqui ninguém nos conhece e água está fresquinha.

 

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Nunca mais vou ao S. João com velhos...

por Fernando Lopes, 25 Jun 18

Sou um rapaz festeiro, onde houver farra, estou batidinho. Celebrei o São João com os amigos de sempre, sardinhas, pimentos, bifanas, cerveja e verde-branco com fartura, por um preço mais que módico. O pior foi depois. Desaparecem uns com as criancinhas – um belo pretexto para se porem mais cedo ao fresco – outros por isto e aquilo vão fugindo da liça. Ficamos pouco mais de meia-dúzia para passarinhar entre as Fontaínhas e a baixa. Nos Aliados tocava o sempiterno José Cid, o Bruce Springsteen à portuguesa. Enquanto o povo bater palmas e ele se estiver a divertir, vai tocando. Devem ter sido praí umas três horas de Cid. Sei bem que a comparação entre Springsteen e Cid é pouco lisonjeira para o americano, mas cada povo tem o Springsteen que merece. Doem-me as costas, tenho amanhã os meus sogros e fófófó fófófó, fiquei eu e a Sónia. Martelamos, conversamos, acabamos a noite a comer Baos, uma espécie de hamburguer de Taiwan, e a beber cerveja. Pró ano, só vou com malta como a Sónia ou arranjo uma rusga de miudagem. Porra, pra velho basto eu, e um S. João terminado antes das 6:00, é porque não valeu a pena.

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Vais armar-te em camelo outra vez, Fernando?

por Fernando Lopes, 20 Jun 18

tunisia_douz.jpgTunísia, Douz, 1999

 

 

Inevitavelmente. Ser um camelo é das actividade que faço melhor e mais amiúde. Às vezes sou um camelo involuntário, outras tantas por destemperança, outras ainda porque prefiro cerrar narinas e pálpebras para não deixar penetrar a areia do mau-carácter e da estupidez. Ser camelo é para alguns de nós modo de defesa, para uns outros tantos apenas a sua natureza. Vivo rodeado deles, uma cáfila que se reconhece entre si, e que, de modo canino, cheira o cu ao alfa a modo de submissão enquanto aguarda por oportunidade para traiçoeira dentada.

 

Este post não tem no entanto nada a ver com os camelos que por aí pululam e prosperam, mas com as férias. Depois de voltas e reviravoltas, se tudo correr como esperado, vou passar uns dias ao Dubai, esse eldorado feito à custa de petróleo, sangue, suor e desespero dos emigrantes, uma força invisível sem a qual o emirado não poderia ostentar o luxo e as maravilhas arquitectónicas porque é famoso.

 

Procurar os lados solar e lunar de um local como este não é fácil, tudo está orientado para as experiências positivas, agradáveis, como se a vida fosse nada mais que uma polaroid de um momento feliz. Sem expectativas, mas com atenção, curiosidade e espírito crítico. Eu depois conto.

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Como portuense e portista interessa-me pouco a questão Sporting, Olhando friamente, a crise não é do Sporting, é de uma sociedade em que o único valor é vencer. Importamos lixo alimentar dos EUA e estamos a valorizar modelos que não eram os nossos. A dicotomia winners/loosers ou vencedores/vencidos, sempre me pareceu de um reducionismo atroz, até porque, as mais das vezes, somos vencidos e não vencedores. Quando o teu marido ou mulher te deixou, foste vencedor ou vencido? Quando a promoção no emprego foi para o lambe-botas, ganhaste ou perdeste? Quando no fim do mês tens 100 ou 200 euros na conta, em que categoria te classificarias? Não interessa tanto se ganhas ou perdes, mas se jogas com empenho, honestidade, entusiasmo. Às vezes sai-nos tudo bem, outras nem por isso. Valemos menos por ter tentado? Há muito mais que vencer ou perder, a vida, o desporto, é muito mais que isso, é uma coisa tão simples como lutar com dignidade. Uma sociedade que merece o meu aplauso é aquela que apoia os que estão em baixo e aplaude os que ganham. Sem hipocrisia, com carácter, sabendo bem que ora estamos num lado, ora no outro.

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E agora para algo politicamente incorrecto...

por Fernando Lopes, 17 Mai 18

Tenho procurado manter-me calado por não ter coisas muito agradáveis para dizer. Hoje apetece-me falar de arredamento no centro do Porto, algo que conheço bem. Desde 1975 que o Estado obrigou os senhorios a serem suporte financeiro da inexistência de política de habitação. Durante décadas as rendas estiveram congeladas, para alterar esse estado de coisas foram dados tímidos passos, titubeantes, que valem quase nada. Quem investiu num prédio ou apartamento para alugar tem hoje uma mão cheia de nada e outra de porra nenhuma.

Escrevo com conhecimento de causa, na Rua do Almada, familiares têm um prédio que tem rendas de 200 euros por um T2 e uma armazém de mais de 600 m2 por 500. O que se gasta anualmente em obras de manutenção é superior aos que os inquilinos pagam, isto é, essas pessoas têm um rendimento negativo. Todos os anos. Há décadas.

 

Com os centros das cidades alvo de grande procura, existem imensas remodelações. O meu melhor amigo é arquitecto e chama-lhe, bem, «fachadismo». Destrói-se o edifício e e a sua história, rebentam-se com clarabóias e vitrais, fazem-se muitos T0s para alojamento local, ignorando por completo o legado histórico e de época que muitos desses edifícios representam. O que está a ser feito nesta cidade não é arquitectura, é uma espécie de «prostituição» ao m2.

 

O Porto, o País, não tem que ter os privados a suportar uma política social de habitação que o Estado não assume. O centro de Londres, Nova Iorque, Paris, Lisboa, não é habitado por idosos pobres, com rendas sociais subsidiadas por particulares. Lamentavelmente, é necessário restaurar em vez de fachadar. Isso custa muito caro, depois da obra pronta apenas famílias de classes altas lhe podem chegar. É a vida.

 

O governo pode sempre comprar a preços de mercado, restaurar, fachadar, fazer o que entender, não pode é voltar a um PREC à moda da Roseta.

 

Compreendo bem o drama social que isso acarreta, o desenraizamento de idosos, as lágrimas que isso causa. Mas não é aos proprietários que cumpre esse papel. Disse. Agora chame-me fascista à vontade. Quero que dane.

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